segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Lânguido reflexo (reescrita)



Eu vivo o rio onde morrerei a nado
eu vivo em minha nave imprópria, decadente e sóbria
a nave mãe da triste ossada
a nave pesada das eternas águas

Eu vivo poente em janela de ideia extensa
novelo de minha jangada densa
Eu vivo a câmera lenta das mágoas

Eu desço o lago do tédio, úmida morada
regaço de minha armada e pólvora do desassossego

Eu naufrago no mar dos trôpegos,
esquinas e sinais vermelhos
O puído dos olhos velhos em meu lânguido reflexo

Eu vivo a nave a recobrar o tato
vez perdido no enfado,
Vivo a reaver o nado neste modesto retalho,
o mundo, em recíproco escárnio

Eu vibro em ondas das quais destoo
rios que me foram expulsos
bombas que me foram postas
versos que voltam como recuos

Eu venho varrer a nuvem espessa
atravessar-me o oceano com a nave imprópria
Eu vivo a nave inglória das promessas

Então navego ao liceu do exílio
onde a nave decanta seus gritos
e onde o mito reencanta a estranha pousada