segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Dois mil e nada (revisitado)



Quando os olhos se enchem por dentro.

um lugar sonha. Põe-me os pés de molho.
põe-se num facho de luz a tocar os pés e a expandir-se.
o lugar do sonho a enterrar o sonho.
a mansarda de um nômade a manobrar a matéria semiviva do corpo.
Onde surge o desconhecido. Onde um sentimento a menos basta.
Onde os olhos doídos não se fecham mais em águas.


É a sincronia do retardo, a máxima.
As água, os olhos, os sonhos... Apodreceram.
O corpo não responde mais a ilhada, não sangra mais,
Não pede mais. Eviscera a palavra Nada, quase toda palavra.
Os olhos, meus olhos, me olham com ares de certeza. Sem raios.
Só a carcaça.

Tem no mundo mais que a besteira de doer e não doer?
Tem mais que a de pensar ou não pensar?
Pois tem a de estar e não estar. E a pior, a de ser.
Mas o mundo está nem aí, está só, na ideia do lobo,
Do dia, da gota, do beijo, da sopa e da linha absorta do tempo.

No sonho, teus olhos contavam maneiras de mentir.
Dentro deles um campo extenso, dentro deles uma vida exata,
Dentro, uma vida inteira.
Havia abismos e manadas. Eu estava preso.
Havia fogo, a faísca do homem, havia carne,
havia sentido. Eu estava preso na felicidade.

A diacronia do atraso. O passado que vai passando sem passar.
O arrasto que vai cessando sem cessar.
Como revisitar o lugar amado na memória,
em que todos os sentidos se embolsam no agora, na resposta,
na besteira-vitória de estar em pleno andar e ver.

quando sabedoria não leva a nada. A Estrada não leva a nada.
A poeira sim, a levar à poeira, ao poema, ao boêmio,
ao passo mais incauto que o do primeiro macaco,
aquela ilhada - que é a alma desalmada. O símio robô
no peito a bombar as desilusões do homem.

A seriedade do olhar que recusa e mata.
O êmulo do finito quando explode em trezentos mares

Chama-se Acordar!*


*(Há um outra versão deste poema mais abaixo. 
Não me importo de publicar esta edição. 
Há textos que merecem um veredito. 
O fiz como se fosse inédito. 
Eu não lembrava do primeiro.)

de costas



...não sei a quem falo.
Fui arrastado pelo caminho.
A quem suplico,
Se a ti, Mulher, estrela ou luz e lágrima
Ou ninguém

Do adro de onde vejo, avesso
Pareces Mulher, e às vezes estrela
Às vezes só a nuvem baça e lágrima
É só Palavra, às vezes eu sei

Me basta e não basta
Veleidade, frivolidade, ódio
Tudo num cálido coração

Persegui teus acentos mais híbridos,
teus enlaces desesperados,
te encontrei nos versos mais pobres
No fim das madrugadas, bêbado,
te elegi miserável.

Fui teu encontro soberbo,
teu resquício inócuo, apenas fiquei para trás
Fui teu rei, tua espada, tua queda
Fui Palavra - sendo teu desterro,
tua impressão viciosa - sendo teu rastro.
E tua hereditariedade macabra: sendo Nada.

O começo, o impulso e a lástima
Fui a ponta dos dedos roçando a relva devagarzinho.
O marido que te perdia acordado, assim
Fui teu adro, cuspido sem casa

Lancei meu Fogo ao feno das águas passadas,
e agora aqueço as mãos sobre as chamas.