terça-feira, 11 de outubro de 2011

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Banho-me no leito mais alvo e luminoso.
De uma desmulher a origem, um começo dos Mistérios.
Onde desocupei-me da traição
e pude dizer-me - Que é a inocência?
Tão vasta luz, tão meigo descanso.

Como tolos, nós, maupoetas!
seguindo o poema já perfeito -
as linhas arremessando-nos no intento atleta,
mas de fôlego lento, de repetir o verso
da Natureza completo.

Mas o atrevimento basta.
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terça-feira, 13 de setembro de 2011

Eu, Dela.

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Olhos tão perto dos olhos dela.

Tais grafistas incertos, os dedos
ébrios e lentos esperam na memória dos olhos
deixar a geometria silente dos detalhes.

- O resto do corpo
Só um corpo idoso flutuando
em calmas e mornas ondas d'água. -

São tantos os cheiros da vida,
tão rápidos os nossos sentidos,
Qual barreira? Qual passagem
Nos deixa jovens envelhecer sem medo?

Ah, devaneios e voltas...
Até que os olhos se escondam,
E de novo o sol revire a lua, a manhã,
o medo, e meus olhos nos teus
se esqueçam outra vez no tempo que passa.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Achado

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A chave do amor, e com ele a felicidade
Está em deixar-se, profundamente, enganar.
Em nada saber.
Apenas a hora
Em que mais não há.


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Aos aflitos


Drummond, vê se me espera num futuro próximo
Não quero morrer, não, isso espere mais
De te ouvir falar do tempo e do amor é que tornei a escrever




Pés que se distraiam atentos aos dela,
Do cigarro, quase silêncio, se ouvia levemente a brasa
E do cinza, a chuva, recém nuvem, se ouvia chegar
Nos olhos que turvam sem dizer, carentes,
E Viam-se por dentro, cheios de carinho.
Dobrados ali, à distancia, mal-entendidos,
Cada destino aninhava-se

Nem quietos, nem seguros. Nem tímidos:
O que a graça de cada amante desenhava
Sobre a pele sempre amarrotada do outro. Onde toda
A infância é faminta e rápida. Onde o futuro reclama
Com força. E tudo é por um triz.

Desdenhavam e condensavam a passagem do Velho. Com a voz
Suave, de repente trêmula, explicavam o amor que não sabiam
Com lágrimas puras e remotas. Poderiam dizer mais, mas
Não caberiam no que tinham de dizer.

Cegos. Acordavam das mãos. Desmentiam-se
Nas entrelinhas. Corriam de suas ilhas. Se abatidos na
Tempestade do amor alheio, apressavam o retorno, infelizes.
Não havia saída. Senão amar-se. Senão findar-se.
Do ninho ao vento, sem saber voar. 

terça-feira, 12 de julho de 2011

Anos a fio

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teus olhos oceanos
tua boca instinto,

quando tudo olhos amantes
bastantes
são as janelas de vidro

foiceada à seda,
a margem dos dentes
ainda imagem,
arreda-se por lábios

senão o respiro
dos meus poros teus

como as ondas
retornam ao mar,
porque o sabem maior

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Preciso porque te amo.

Açucena














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Sertão Mar
Sertão
Nada
Sertão,
como nado,
nas águas
do meu coração
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domingo, 12 de junho de 2011

Ao meu vício, lírio, perfume

A minha pequena fada de Baudelaire
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Se a Vida

veio da Água

Tudo se fez

dos teus olhos
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segunda-feira, 23 de maio de 2011

Obras completas

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Olhar o passado:
Rir

Não entristecido

Não ter no destino
o atalho da morte
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terça-feira, 26 de abril de 2011

não contam as causas daninhas

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têm olhos que disseram: cuide-se
outros que haviam cuidado demais

aqueles que disseram: calma
e não voltaram... aqueles que não houveram

bastassem as solidões pesadas,
e os negros andrajos do inimigo
e os rasgos amargos
e as selvagens porções negadas

a fome

o revés

se olvidassem as pás-de-corte do passado,
e gotejassem um beija-flor sobre o nome da morte
aqueles olhos fossem menos sangue,
menos desastre, mais conforme... o vento, talvez

juntara-se nada perto de quase nada,
e o ciclo permaneceria aberto,
com os giros cada vez mais apertados,
levando com moléstia a falsa carcaça

sim... do amor
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terça-feira, 12 de abril de 2011

a cada dia mais difícil

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escondi-me noutras vilanias...
rabiscos, arabescos, discos
nas seringas e mesquinharias de prata

na indecisão promíscua,
a lívida confusão da essência-cor
na pele de um dálmata

não regressei à Auschwitz
mal saí de lá, sei... mal saí
mesmo vivendo de frestas
me dói no inverno a dor mais fria:
cerrar as janelas e não vê-lo voltar

assim depositei num gesto sonífero
a alma acolhida num veio d'água

e na zona ambígua do meu átrio
legislei o mais tirano dos pornocratas
benfazi as deusas mais suculentas,
as que evitavam mágoas

contei as vezes estrangulado,
e não aprendi os traços da amenidade,
nem orgulho

da hora de afrouxar as rédeas:
o árduo forcado de restos
que tua corrida inspirava

(mais vida, mais risco, mais riso)

derrubei grades e retorci ferros,
a que tua liberdade
respondeu em agulhas apuradas:
estradas, céus

quando desdisse de mim o crédulo, vi o cego
insultei até o surdo de mim, o burro
e de mim desconheci os pregos,
destes, onde não advinhei os lados,
sabendo a lição:


sangrar, posso sangrar, e sangrei até
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sábado, 26 de março de 2011

nevoeiro, ou todas as soluções precipitam

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que me nublam as coisas vividas,
que a memória não desfaz em cores fracas, nem enfraquece,
que de viver num caminhão de cimento, girando, virando
que se derrubam: casas e árvores e flores e amores a mais

que na posição de um feto eu volto,
gemendo palavrões, e colidindo sob a pele enrijecida
sob um arranhão, igual aos reparos de um inábil arqueiro,
onde o alvo... já equivocado... ao chão

testemunho de uma despedida,
o olhar perdido de um câncer materno,
vendo sem habitar a sala-de-estar pela última vez,
as fotos, enfeites, os filhos e o vozerio das alegrias,
sabe o que é morrer perdido, e ainda atento demais?

daqui não se ouve socorro, e quando... já não basta
o sol silenciou seus raios, medrou... (quantas reticências):
obscureceu.
e quando bateu a porta, refletiu, não adianta
de que adianta mais um tapa, um surto, um estampido

triunfou a mudança: caixas vazias, corredores vazios,
móveis fora de lugar, imóveis
um quintal visto da janela onde os netos é que morreram
e a natureza perdida se atropelou no tempo

não tem glória, nem céu, nem rutilação que comporte
o passeio sofrido deste arado: os olhos bem abertos
numa poeira de pregos...
o sangue coagulando debaixo da chuva, prolongado
na mancha escura, na água suja e desmerecida
do que passa
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segunda-feira, 21 de março de 2011

Onde estão as roupas

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não coube nos termos -...
e de pouco se foram os ângulos, um por um
se foram os anjos, as doces alamedas, o gás
como as maçãs também se foram das mesas
como as crianças cresceram,
e as delícias salgaram...

os cães cessaram de buscar o rabo, 
os postes desacenderam, e a lua caiu
só o cozimento do tempo ficou:

no remanso do gesto que perfazia
através dos dedos uma calma inadequada

não sobraram perguntas, nem horas marcadas
os rebuços caíram das caras,
e asas lisas dos olhos decolaram

deitaram-se aquelas coisas na rocha aquecida
diante do mar... as ondas se foram
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quinta-feira, 10 de março de 2011

O lago morto

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Onde está a graça de dizer-Te?
Repetir o encanto de sempre...
Porque cozi num dia morno
E acordei num ninho atacado, lentamente destruído.
Envelheci todas as plantas ao redor
E só amei o sol do fim.
Não disse adeus. Fui o velho deixando o bar
pela última vez.
Ao tocar o frio, despejei o resto da calma.
Solucei com um pouco de orgulho e violência.
Deprimi meu corpo. Desisti. Ancorei.
E sem morrer ainda, aquela fantasia
imanta o carnaval na mais besta das saudades....
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domingo, 20 de fevereiro de 2011

às tuas cores Amarelas

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Não tens mais o presente,
que foi tomado pelo mistério,
pelo tremor de tudo que pulsa,
sábio e não sabido, forte e virgem

Mas tens todos os tempo do amor
guardados...
Cerziste nas mãos e nos dias, amarelos e negros,
a eternidade travestida em mim

Tu és a Sombra,
Não, nada em ti obscurece
... soubeste o frescor, arejaste todos os quartos fechados,
ultrapassaste o Mofo destituindo as tristezas

(tua)
A sombra onde os namoros descansam,
onde os velhos aliviam,
onde as crianças desejam,
onde os cães bocejam,
onde os fins se acalmam da dor

Sopraste naus inteiras de felicidade.

Aprendi a dizer,
inscrevi em mim a necessidade de dizer,
redizer, desdizer
Que a onda sonora infiltrava toda
a minha ignorância no cofre do teu ouvido,
onde até então e depois só caberia a nata do ouro,
só mereceria o Ouro, só aceitaria a Vida, não menos

Traduziste meus nervos,
embalsamaste com tua própria e perfeita fonte
as minhas vísceras atiradas no teu chão

Foste o cais de alguém sem destino,
Inventaste o destino,
de alguém sem cais, sem pés, sem pai, sem nada.
Foste o próprio Amor.
O abraço de alguém que desaprendera seus braços,
Foste o barco de quem desaprendera o Mar.

Foste o curto espaço de Tempo,
o Tempo inteiro, o Amor inteiro,
foste Tu e Eu e todos, o que deixaste o teu mestre e teu destino
Foste inteira e soberba e derradeira
E orla dourada de um planeta perdido...

A menina, o sonho, o cadáver, o recém-nascido
Nunca haverá conjugação no Passado,
porque todo ele é imperfeito para Ti

Haverás de destilar teu perfume Novo
sobre todas as casas desse velho mundo
Haverás de agitar os pasmos, alimentar outras vidas...
Haverás de amar incansavelmente,
pequena deusa trêmula,
porque o Amor é tua mata, teu limbo e teu altar
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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Bardos

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no mais das vezes um olhar repleto,
aquele Velho soubera eriçar os dias
literando amores nos baixos continentes,
sobre o largo suspiro da terra: do aterrador gemido
da pele

tão raso e repetido gesto, tão hosnesto e temível:
surrar o opróbrio de desdizer o dito...
de rejeitar em nossos átomos seus lábios elétricos,
o açucar nefasto de noites despidas em vapor e sal

soubera importunar o hábito, aliciar a carne,
o tecido obscuro, o cretino Não do interdito
ele havia reescrito em falhas microscópicas,
em discretas maquinações e sentenças de morte,
o colapso do parco coração dos homens

suas retas minúsculas cobiçaram erros astronômicos,
seus ângulos flertaram espirais

da geografia feminina do corpo,
ele extraíra o compêndio eterno da imoralidade:
mais pornográfico e menos anárquico que qualquer
obscenidade sugerirá: ele formulava seus gozos

o gênio da indecência via Atena perturbada,
entre a Ordem, a Ilha e a Guerra,
ele anunciara o desejo do armistício flagrado
entre as pernas dos bípedes intelectuais

ele diria adeus ao próprio nome,
com peso...
com a candura das mãos de uma cabeleireira
com o néctar de todas as páginas sofridas,
ele retornaria abrasivo no dorso de um mistério
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sábado, 12 de fevereiro de 2011

Amiúde

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... os vincos e o olhar na sorte dos arbítrios
quando fores longe, o método das festas
quando voltares,  a preguiça dos mares

e quando não,
a sede geométrica, o mapa das folhas

quando persistir em nada:
quando o híbrido incontornável
contornar o vão das peles

nem cansaço nem vigor nem vício
sabe um corpo exausto, e nos olhos parados
um riso no canto dos lábios
cantando doces profissões de fé

a alma tornando-se braço
e a lírica a varrer das garrafas
o pó dos amores
são todos pedaços de noite,
teus pedaços em gestos perdidos,
em trejeitos que se imitam...

nos desejos que suspeitam dos nomes
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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

As relvas profundas

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Luz amarela; auréola sedutora; espelho solitário.
Luz de Pessoa; arco pranteante; comédia opúscula.
Das horas que passei em branco, mármore robusto
Te aprendi de perto, Luz noturna, Te saudei amante

Um átrio pálido de luxo e resquício, onde sobrei
Ignorante, Crédulo, Querente. Uma mesa de rascunhos
E as linhas absortas na indecifrável tarefa de si
O cálcio de uma arquitetura destruída, o corpo de um faminto

Peito: Esta cratera que acoa e se eclipsa,
Generosa fenda onde as gueixas dormem. Onde é luto
Ali onde me ponho fora, Ali onde arrebento
E tantas, tantas, Tantas vezes me recuso

A recusar também a Negação. Um sobressalto de Sáude.
Quando meu leito é todas as coisas. Quando expulso a ladainha.
Quando despacho quaisquer dos troféus. Quando trafego
Toda a estrada, refaço todo o caminho, Esquecendo!
Entre a lagarta e o voo brincando com a vida inteira.

Quantas noites na mais clara e sufocante das escuridões
Quantas vezes Eu, Eu outraz vez, novamente Eu, o pequeno
Ser repugnante. O ouro falso do lodo. O fastio pegajoso das formas.
Vergar a memória, a torpe imaginação, vergar a posse e o desdém...

Ver o mais alto, o pior, o jogo das navalhas e das flores:
Te amar. E amar aquele que tu amas. Amar a minha ausência.
E as mãos que te pegam. E a saliva que te gasta. E o espasmo que te goza.
Entre os dois, na matéria escaldante, estarei lá. E depois, nas sobras, também.

Eu sei, porque já estive lá. Eu sei, porque experimentei. Eu sei, porque sofri.
Infelizmente. Para o coração, metáfora puída. Para os dias calmos.
Para o casamento e o prazer dos domingos. Para a paz dos abraços.
Para tudo o que sente pela metade: Eu amo ser deixado. E todas as coisas.
Eu amo ser escravo. E todas as coisas. Eu amo ser todas as coisas.

Já com os tendões rasgados, com os braços pesados e o olhos náufragos,
Já sabido, desmentido, pisado. Eu posso dizer essa coisa, eu posso cantá-la.
Eu estive e estarei lá. Eu a conquistei e haverá de deixar-me eternamente.
Porque os cantos escuros da sala, porque as calçadas, porque os porres me têm.
Eu posso dizê-la, eu posso cantá-la e desfalecer no rosto dos esquecidos:
Eu fui o mais fraco, não me tornei mais forte, Mas estive vida, fogo e vida, meus filhos
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