sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Partícula IV: Roman Woolgar, ainda

Roman seguia com as mãos praticamente imóveis sobre a mesa, os pés frios traziam algum incômodo, mas não o impediam de fixar suas idéias em si mesmo. Nada, quase nada a fazer, um nada rodeado apenas pelo múrmurio da rua, bastante vago, e o ruído confuso da máquina de costura não muito longe, no quarto ao lado, talvez - de uma jovem muda que ali habitava por ora, um tanto estranha, parecia, mas bastante simpática em sua mudez. Uma introspecção leviana o entretetia nessa hora, como poderia prorrogar tamanha resignação, tamanha hesitação, assim, tão conscenciosamente, como se medisse e aceitasse a cada segundo o exato peso de suas pernas, o ouriçamento imprevisto de seus pelos, a mediana temperatura do corpo, e toda a série de incalculáveis pormenores que movem o universo inteiro sem que nos faça a menor diferença; esta, pois, na vida de Roman, tem sido a incorruptível verdade entre um segundo e outro. Uma sorte de etecéteras invisíveis acompanhavam aquela solidão mestiça, Roman negligenciava a idiotice e o destino, nisso era um homem admirável e inteligente, assim escapava de uma banalidade morta, de uma simplicidade estéril; costurava suas vísceras diariamente, por vezes deixando algum rastro de verme, e não vacilava em sua superficialidade, quando esta lhe era possível, já que nosso curioso Woolgar era um poço desconhecido. Como num salto, um belo descanso de si apareceu, era Natalie quem batia à porta, já pela énesima vez desde o apagar de suas idéias vãs. - Vamos, Roman, sei que está aí, sinto cheiro de chá, seu bobo, abra!

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