segunda-feira, 13 de julho de 2009

Bilhete de final feliz

Tristeza,

Saí de casa, não pela porta dos fundos; tive que dar a volta por cima. Deixei a melancolia na gaveta dos discos; o tédio, na caixinha ao lado dos teus remédios. Não deixa de quitar as prestações da indiferença que estão em cima da mesa, e guarda os recibos, pode ser no console da escrivaninha, ao lado dos teus livros de falsa sabedoria. Cuida bem do cachorro (meu Tristão), e não descuida da gata também (tua Isolda). Ainda deixei arrumado teu lugar preferido no quintal, o poço-sem-fundo. O jardim está limpo, não deixa abarrotar de folhas secas, de qualquer maneira, será impossível cobrir tua solidão. Se preferires, não me importo, ainda podes fingir que existo no jantar; põe na mesa dois pratos e engole tua sopa, com pãezinhos torrados que o diabo amassou, se der, consome também tua própria amargura. Aos domingos, podes morrer de fome. Ainda neste inverno, podes usar a lareira, queima tua vaidade com uma boa xícara de chá nas mãos, mas não esqueça de apagar o fogo. Logo a miséria passa, Tristeza, e tu te acostumas com tua saudade mesquinha. Passe bem.

Feliciano

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