chorei fazendo coisas banais, chorei porque era domingo
atravessei uma rua, pisei em cacos de vidro,
na esquina uma roseira cobria um muro pálido
um pai esperava o filho de braços abertos
uma porta rangia distante, um pássaro voava sem rumo
no chão estava escrito “se joga” nas duas metades de um bilhete
tentei suturar em vão um coração partido
um pouco de cada em mim, e os meus olhos
marejados tingindo o arrastar do dia, meu próprio arrastar
chorei pensando coisas banais, chorei porque não estarei contigo
quando as chuvas do outono chegarem, num dia qualquer
de um mês qualquer, não vou pegar da tua mão,
não haverá música
às vinte e duas horas do dia 3 de junho não estará mais
pensando em mim, eu não ficarei mais sem jeito ao teu lado
não haverá arrepio, zelo, sonhos, olhos fechados
teu nome, que tanto amo, será apenas o nome de alguém
meu nome será apenas um nome
no final da rua, um minotauro vigiava um labirinto sem saída,
pensei que era o fim, então ele me abraçou, sentamos
estendeu-me a mão quando eu gaguejei:
ainda é verão e faz tanto frio
ainda é dia e por que tantas sombras?
ainda amo e tudo é passado
ainda sigo o rastro e estou tão perdido
chorei porque chegou a noite, porque caiu uma estrela,
porque abri o livro e só restavam poemas que o tempo extinguiu
chorei antevendo o equinócio da primavera:
quando o céu despejar luz sobre as flores,
não será a tua luz, não serão as minhas flores,
o céu que era nosso não mais será
chorei lembrando a certeza trucidante de A vida breve:
“o mal não está em que a vida promete largo e
dá estreito; o mal é que ela sempre dá e depois tira.”
chorei implorando um pouco mais de ar, que eu
pudesse ao menos chorar em paz… o coração não
deu ouvidos, havia um amor infinito atravessado na minha garganta.
Um comentário:
Ainda…
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